INVENCÍVEL - Comics
Ryan Ottley cria painéis dinâmicos como poucos.
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O personagem
Mark Grayson é filho de Nolan Grayson, secretamente Omni-Man, o maior super-herói da Terra. Ao desenvolver os poderes de seu pai no final da adolescência, Mark (Invencível), tentará seguir os passos do lendário Omni-Man.
Os autores
Robert Kirkman
A série The Walking Dead tornou Kirkman um dos roteiristas de quadrinhos mais ricos da atualidade.
Mais conhecido por ser o criador da série The Walking Dead, que ele mesmo adaptou para a TV, Kirkman escreveu diversas outras séries independentes assim como da Marvel, sendo essas Ultimate X-Men, Homem-Formiga e Zumbis Marvel. Além de ser um dos cinco sócios da Image Comics, Kirkman tem dividido seu tempo com produções e roteiros de séries e longas para o cinema.
Cory Walker
Cory Walker em seu melhor momento.
Co-criador de Invencível, seu traço estilo linha clara chamou a atenção de outras editoras e da Marvel. Para esta última ilustrou capas e histórias do Homem-Formiga, Justiceiro, Homem-Aranha e outros. Depois de ilustrar os primeiros números de Invencível, Walker retornou nos últimos números com um traço mais evoluído e interessante.
Ryan Ottley
Ei, eu também tenho uma parede com tijolos expostos e uma estátua do Darth Vader do meu lado.
Mas as semelhanças acabam por aí.
Reconhecido como o ilustrador que sedimentou Invencível aos olhos dos leitores, Ottley tinha sido despedido de uma loja de ferramentas quando decidiu que precisava divulgar intensamente seu trabalho. E deu certo. Kirkman viu seus trabalhos no site Penciljack.com e o chamou para ilustrar Invencível. Ottley entrou para substituir Walker, que não conseguia cumprir os prazos da editora à tempo. Ottley ilustrou quase todos, quando então revezou com Walker os últimos números, para fechar esteticamente a série. Com apenas 2 ilustradores durante 144 edições, esse foi um feito raro em um mercado editorial onde ilustradores de séries longas costumam ser trocados a cada ano. Depois do final da série, Ottley passou a ilustrar o Homem-Aranha para a Marvel.
Os quadrinhos
Atenção: contém alguns poucos spoilers, mas diante da enormidade de surpresas e reviravoltas na série, essa crítica contém no máximo 1% de spoilers.
Arte de Freddie Williams II.
Artistas convidados produziam miniposters internos para as edições.
Esse é uma clara homenagem ao poster de Superman II de Richard Donner.
Lançada em 2003 e encerrada em 2018, Kirkman e Walker esperavam que a série pudesse durar alguns poucos anos, mas graças ao excelente roteiro e traços elegantes e dinâmicos dos dois ilustradores, a série durou 15 anos distribuídos em 144 edições e mais alguns spin-offs em formatos de minisséries. E o melhor de tudo é que foram os próprios autores que decidiram que era melhor finalizar tudo do que viver para ler seus heróis em aventuras medíocres. Que é o que acontece com todos os heróis que tem séries sem data para acabar ou sequer dão pausa.
Toda a premissa e mesmo as aventuras de Invencível, de forma genérica, já foram vistas em diversas outras séries de heróis. Se assim é, onde está a novidade e porquê os próprios autores colocaram na capa, em certo ponto, a chamada "o melhor quadrinho de super-herói do universo"? Para começar a entender isso, comece a ler a revista e tente parar de ler depois da edição nº7.
No universo de Invencível, quando super batalhas acontecem, centenas, às vezes milhares de civis, costumam morrer.
O traço cartunesco de Cory Walker cria um belo contraponto com a violência.
Bom, me parece que a grande sacada de Kirkman e parceiros foi pegar tudo o que de mais interessante a Marvel, DC e alguns autores como Moore, Millar e Ellis já haviam produzido e sintetizar isso em um número limitado de edições (144 números + minis), com foco no personagem Invencível. Assim, você tem a imaturidade e entusiasmo de um jovem Homem-Aranha, a mitologia de um Super-Homem, as excelentes conversas banais de quadrinhos independentes, a violência de um Authority em um traço que lembra animação, questões políticas que remetem à Miracleman, o amadurecimento de um Ken Parker e o principal, alegrias e tragédias marcantes. Para falar a verdade, esse foi o único quadrinho que me fez literalmente aplaudir algumas cenas.
Tudo isso, é claro, só acontece porquê os personagens vão se tornando cada vez mais tridimensionais, repletos de nuances e ambiguidades à medida que a trama se desenvolve e eles amadurecem ou são transformados pelos acontecimentos. Diferente da maioria das revistas do gênero, os personagens envelheceram mais ou menos no mesmo tempo que seus leitores. Vilões podem se tornar heróis e vice versa, pois mudanças de caráter e opinião é algo que acontece tanto na vida real quanto no universo criado por Kirkman, Walker e Ottley.
Apesar de ser da editora Image, Kirkman conseguiu um acordo com a Marvel e incorporou uma visita ao universo Marvel dentro da narrativa cronológica de Invencível.
E ele aproveita para se divertir.
Kirkman, sempre que pode, brinca, manipula e subverte com maestria todos os clichês do gênero e surpreende o leitor continuamente desconstruindo de forma inteligente tanto cenas de ação quanto diálogos. Assim, vilões controladores de mente que em histórias convencionais demoram dias ou horas para serem derrotados, são incapacitados com uma mera pedra jogada de uma distância segura.
Ou alguns crimes de vilões desesperados são resolvidos com conversa e sem violência alguma. Ou quando um personagem se revela gay e a reação dos amigos é completamente natural.
É óbvio que Invencível não é só conversa, sobra ação o tempo todo, mas a questão é que quase sempre a ação tem um fundo emocional ou perigo real, sendo muitas vezes inevitável de acordo com o antagonista. Assim, quando Invencível enfrenta um sociopata de outro planeta, a batalha dura 3 edições completas e é uma das mais sangrentas e catárticas lutas que já tive a oportunidade de ler. E já faz 45 anos que leio quadrinhos. Aliás, esse é dos grandes problemas de muitas histórias de super-heróis. Os leitores compram esperando grandes cenas de ação, mas no geral elas são curtas, duram entre 1 e 3 páginas, não são bem coreografadas/editadas e tem excesso de conversa. Isso não acontece em Invencível. As conversas são reduzidas nas cenas de ação, as cenas de lutas importantes são estendidas para garantir um impacto emocional e são bem planejadas e coreografadas. Ou seja, existe um cuidado para imergir o leitor dentro da batalha e não apenas fazê-lo folhear as páginas entediado com brigas pífias e previsíveis.
No filme Homem de Aço, de Zack Snyder, a inspiração para o uso da supervelocidade nas lutas parece ter sido tirada diretamente das ilustrações de Ottley.
Nesse arco chamado Conquista, a adrenalina provocada no leitor é equivalente à violência da batalha.
Além de subverter e brincar com os diversos heróis que fazem parte deste universo, Kirkman usa e abusa criativamente de conceitos como realidades paralelas, viagens no tempo, invasões alienígenas, origens de heróis, consequências realistas da existência de heróis no mundo e até mesmo cria um reboot dentro da própria série que afeta a cronologia da série regular. Coisa fina. E falando em reboots, o personagem de Grayson é fã de quadrinhos e volta e meia tem discussões sobre quadrinhos na sua comics store preferida e lá Kirkman aproveita para criticar e debochar da indústria dos quadrinhos e até mesmo de suas decisões narrativas com o personagem.
Sobre o planejamento geral da série, apesar do claro talento de Kirkman e companhia, as primeiras dezenas de números contém uma ou outra cena interessante ou que parecia importante que acabou sendo deixada de lado (ou convenientemente esquecida) devido a novas reviravoltas e acontecimentos na narrativa. Por um lado, isso é bastante perdoável, pois a série tem dez vezes mais acertos do que erros no que concerne a respeitar a ordem cronológica e consequências dos atos de cada personagem. Tamanha complexidade e entrelaçamento de personagens só lembro de ter visto em Watchmen, para ficar apenas no gênero.
Um dos grandes trunfos de Invencível, é que personagens importantes podem morrer a qualquer momento. Invencível é o Game of Thrones dos super-heróis.
As consequências dos atos de vilões e heróis são fatos que nunca são esquecidos, sejam elas pequenas ou enormes e essa atenção a esse tipo de detalhe torna a leitura rica e são sempre um elogio de Kirkman à inteligência do leitor, mantendo sempre um ótimo nível tanto na escrita quanto evitando superexposição de fatos passados, recurso muito utilizado por quadrinhos voltados para adolescentes, onde personagens repetem a cada edição coisas que todo leitor já cansou de ler já na terceira edição.
Já o final de uma série tão longa deve ter sido algo que atormentou Kirkman e seus associados por muito tempo, pois como finalizar com chave de ouro uma série de super-heróis com contornos tão humanos quanto galácticos? Optando por se deixar influenciar por grandes obras como Superman:Identidade Secreta, a série de TV À 7 Palmos e ao filme de Spike Lee, A Última Noite.
Quem leu ou viu todas essas referências, deve ter uma ideia do que estou falando.
E Depois de 15 anos e mais de 170 edições no universo de Mark Grayson, Invencível me convenceu de que é o melhor quadrinho de super-herói (em série) do universo.
A obra, que começa em um tom juvenil e um tanto bem-humorada na maior parte, vai se tornando mais complexa e trágica à medida que o personagem cresce.
Depois de Invencível
Em 2005 a Paramount comprou os direitos da obra e Kirkman escreveu um roteiro. Mas ficou por isso. Para você ter uma ideia, mesmo uma trilogia longa como a do Senhor dos Anéis não daria conta da duração necessária para abarcar todos os personagens e cenas essenciais da série. O ideal mesmo seria 12 filmes de 3 horas cada. Mas como isso é impossível, talvez 6 filmes de 2 horas cada deixando apenas o essencial e cortando metade dos personagens. Mas como o personagem é praticamente desconhecido até mesmo entre fãs de super-heróis, as chances são bem pequenas. Então o quê?
Bem, a Amazon acaba de anunciar neste mês de junho, que fará 8 episódios em animação de Invencível, cada um com 1 hora de duração. Com possibilidade para uma segunda temporada caso a série tenha uma boa audiência. A questão é se vão manter o nível adulto e violento dos quadrinhos.
Contra oponentes sociopatas muito mais poderosos, Mark Grayson vai descobrir que não pode haver trégua nem clemência (repare na fratura exposta no cotovelo do herói).
Arte de Ryan Ottley
Por outro lado, desde o ano passado que Seth Rogen (Besouro Verde), ator, roteirista e produtor está tentando fazer um filme de Invencível e saiu uma grande matéria sobre isso em fevereiro deste ano sobre como ele e Evan Goldberg estão trabalhando o roteiro do filme com a benção de Kirkman. Provavelmente irão trabalhar o primeiro arco dos quadrinhos. Espero que sim, ou o filme pode ficar bastante confuso se introduzirem aventuras espaciais antes de fincarem o pé no chão. Mais ou menos como fez a Marvel, que começou em uns poucos lugares do planeta e com o tempo, expandiu para todo o universo.
Àqueles que acham que o gênero de super-herói está ficando repetitivo na tela grande, podem esperar grandes surpresas se o tom, dinâmica e complexidade de Invencível forem mantidos no cinema. Para mim, que passei a adolescência vendo apenas um filme decente baseado em quadrinhos a cada 2 ou 3 anos, a época cinematográfica atual são meus maiores sonhos nerds se tornando realidade.
Um filme de Invencível que chegasse ao ponto de abarcar os arcos cósmicos que se iniciam na metade da série, necessitaria do mesmo tipo de orçamento e qualidade de produção de um Star Wars ou Vingadores:Guerra Infinita.
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